10/03/2003 Undime
Fotos: Divulgação |
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Obras reprovadas Os livros didáticos devem ser avaliados por técnicos do Ministério da Educação e do Desporto. Para serem aprovados, eles não podem ter erros de informação e de lógica, indução ao erro, afirmações preconceituosas nem doutrinação religiosa. Também pesa, na avaliação, a qualidade metodológica do livro. Em 2001, o MEC avaliou coleções de livros didáticos para alunos de 5ªa 8ªsérie. Foram reprovadas 39 obras dentre as 104 analisadas, o que representa 37,5% do total. De acordo com o critério adotado pelo MEC, se um livro de uma coleção é excluído, os demais também não são aprovados. Em 2000, o percentual de reprovação dos livros foi maior, chegou a quase 50%. A frase ‘‘Trata-se de um livro preconceituoso, racista e que fere a auto-estima da comunidade negra, no momento em que, eu diria, há uma cruzada nacional, com repercussão internacional, na luta contra o racismo.’’ Paulo Paim, senador (PT/RS) A frase A frase |
Fotos: Divulgação O menino chegou em casa amuado. Avisou que não queria mais voltar para a escola. Não demorou muito para a mãe descobrir o que havia deixado o filho tão transtornado. A leitura do livro Banzo, Tronco & Senzala (fotos) em sala de aula era a razão de tamanha revolta. O menino negro sentiu-se humilhado e discriminado perante os colegas. ‘‘Qual é a auto-estima de uma criança negra quando recebe um livro onde se diz que se o seu povo um dia foi escravo, os culpados foram os negros (traidores), e não os europeus da época, mercadores de escravos?’’, denuncia o senador Paulo Paim (PT/RS). Ele foi procurado pela família do menino, que pediu providências sobre o problema. Logo no primeiro parágrafo da apresentação da obra, as autoras Elzi Nascimento e Elzita Melo Quinta dizem: ‘‘Banzo Tronco & Senzala conta a história dos negros africanos no Brasil. Traídos e vendidos por sua própria raça, eles se transformavam, no Brasil, em mãos e pés do amo branco.’’ Paim entrou em contato com a Secretaria de Educação do Distrito Federal, avisando que o livro estava circulando nas escolas brasilienses. Para resolver o problema, o governador Joaquim Roriz deve publicar, hoje, uma ordem de serviço determinando a obra seja recolhida ao Núcleo de Acervo Bibliográfico e Livro Didático. No documento, o governo também recomenda às escolas da rede privada que não adotem o material didático, por ‘‘depor contra a cultura negra e sua importância na formação do povo brasileiro, referindo-se aos negros de forma pejorativa e preconceituosa’’. A deputada distrital e ex-secretária de Educação Eurides Brito explica que o livro Banzo, Tronco & Senzala não faz parte do acervo de livros adotados na rede pública do Distrito Federal. Mas as escolas, segundo ela, têm autonomia para escolher o material didático complementar e podem comprar livros com recursos próprios e das associações de pais e mestres. ‘‘Por isso, o governador está publicando a ordem de serviço’’, justifica Eurides. A secretária de Educação, Maristela de Melo Neves, afirma que as autoras do livro se comprometeram a revisar a obra. ‘‘Até lá, pedimos que as escolas suspendam o uso do livro.’’ Conceitos errados Para o senador Paulo Paim, o mais grave do livro está nas ilustrações, que mostram os negros como macacos. ‘‘Trata-se de um livro preconceituoso, racista e que fere a auto-estima da comunidade negra, no momento em que, eu diria, há uma cruzada nacional, com repercussão internacional, na luta contra o racismo.’’ Avisado sobre o problema do livro, o ministro da Educação, Cristovam Buarque, pediu que o comprassem imediatamente, para fazer uma avaliação. ‘‘O texto, sinceramente, não é grande coisa, mas não incomoda. O que chama a atenção são as gravuras, que põem os negros como macacos, que ridicularizam os seres humanos. Não podemos ter obras que ironizem raças ou sexos’’, diz Cristovam. No dia 5, o senador Paulo Paim recebeu em seu gabinete as autoras da obra, Elzi Nascimento e Elzita Melo Quinta, e um representante da editora Harbra, responsável pela publicação. De acordo com Paim, a editora se comprometeu a recolher os milhares de exemplares em circulação no Brasil há quatro anos. A obra deixará de constar inclusive na Internet. As autoras garantiram que vão reescrever Banzo, Tronco & Senzala, resolver os problemas existentes e só depois reeditá-lo. ‘‘O que eu observo é que não há preparo científico de muitos escritores de livros infantis, que simplesmente detêm a técnica de transmitir as mensagens para as crianças. Banzo, Tronco & Senzala só poderia ser publicado depois de ter passado por um especialista no assunto. Um historiador ou um antropólogo não teria deixado sair um livro como esse, cheio de conceitos errados, transmitidos de forma preconceituosa’’ acredita Eurides Brito. Segundo a deputada, mesmo que a intenção das autoras não tenha sido essa, o resultado foi preconceituoso. ‘‘E a pior forma de racismo que conhecemos é essa: camuflada.’’ Para evitar que o problema se repita, o senador Paulo Paim está preparando um projeto de lei determinando que os livros didáticos e paradidáticos passem por um controle de qualidade antes de serem lançados. ‘‘Não é censura. Mas hoje não temos o Inmetro para testar vários produtos? A carne não tem carimbo? Os hotéis não são avaliados com estrelas? É isso que eu quero que aconteça com o livro didático.’’ O Correio procurou o representante da editora Harbra para falar sobre o assunto, mas não teve retorno até o fechamento desta edição. Obras reprovadasOs livros didáticos devem ser avaliados por técnicos do Ministério da Educação e do Desporto. Para serem aprovados, eles não podem ter erros de informação e de lógica, indução ao erro, afirmações preconceituosas nem doutrinação religiosa. Também pesa, na avaliação, a qualidade metodológica do livro. Em 2001, o MEC avaliou coleções de livros didáticos para alunos de 5ªa 8ªsérie. Foram reprovadas 39 obras dentre as 104 analisadas, o que representa 37,5% do total. De acordo com o critério adotado pelo MEC, se um livro de uma coleção é excluído, os demais também não são aprovados. Em 2000, o percentual de reprovação dos livros foi maior, chegou a quase 50%. A frase‘‘Trata-se de um livro preconceituoso, racista e que fere a auto-estima da comunidade negra, no momento em que, eu diria, há uma cruzada nacional, com repercussão internacional, na luta contra o racismo.’’ Paulo Paim, senador (PT/RS) A frase‘‘O texto, sinceramente, não é grande coisa, mas não incomoda. O que chama a atenção são as gravuras, que põem os negros como macacos, ridicularizam o ser humano. Não podemos ter obras que ironizem raças ou sexos.’’ Cristovam Buarque, ministro da Educação A frase‘‘O livro só poderia ser publicado após passar por um especialista. Um historiador ou um antropólogo não teria deixado sair um livro como esse, cheio de conceitos errados, transmitidos de forma preconceituosa.’’ Eurides Brito, deputada distrital (PMDB/DF)