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14/03/2007 Undime

Carta Aberta do Movimento de Luta por Creches ao Presidente Lula, à D. Marisa e à Nação Brasileira

Nós, mulheres educadoras da Rede de Educação Infantil Comunitária da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, pedimos cinco minutos de sua atenção para a situação de milhões de crianças entre 0 e 6 anos que hoje estão matriculadas em creches e pré-escolas comunitárias e beneficentes deste imenso país.

Em nossos municípios, como na maioria dos centros urbanos brasileiros, é cada vez mais comum encontrarmos crianças de 3, 4 e 5 anos trabalhando e zanzando pelas ruas!  Mas a atenção da sociedade só se volta para elas quando já estão maiores, quando já são capazes de ameaçar! Então, os jornais e a TV falam dos meninos e meninas que estão nas ruas como se já tivessem nascido ali, brotado do asfalto! Esquecem de lembrar que essas crianças já tiveram 3 meses, 3 anos. E estão hoje nas ruas por serem filhos de políticas econômicas que concentram a renda; filhos da fome, da miséria física e espiritual de seus pais e da sociedade em que vivem. Os meios de comunicação falam dos adolescentes de rua como se tivessem nascido grandes... Mas, é bom perguntar: quem cuidou dos bebês que têm, hoje, 13, 15, 18 anos?

De acordo com o artigo 227 da Constituição Brasileira "É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente com absoluta prioridade, o direito à vida, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los à salvo de toda forma de negligência, violência, crueldade e opressão".

É em nome deste preceito constitucional que nos dirigimos à nação brasileira, em especial ao presidente Lula e à sua esposa, D. Marisa, assim como aos congressistas e governantes estaduais e municipais.

Somos mulheres educadoras! Desde finais da década de 70, assumimos a responsabilidade de cuidar de crianças pequenas, cujas mães, moradoras dos bairros mais pobres da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, precisavam trabalhar fora de casa. Com o objetivo primeiro de tirar as crianças da fome, do abandono, da falta de higiene e saúde, nos mobilizamos, conquistamos e organizamos espaços destinados a acolhê-las: uma casa, um barraco, um salão da igreja ou da associação de moradores. Pouco a pouco, o compromisso com as crianças nos levou aos bancos escolares, ao curso normal, e até mesmo à universidade, buscando uma formação que nos torne capazes de contribuir para o seu desenvolvimento integral.

Hoje sabemos que esta não foi uma iniciativa isolada; que não apenas no Rio de Janeiro, mas também em Recife, em Salvador, São Luís, Fortaleza, Natal, Belo Horizonte, Belém, Porto Alegre, ou, mesmo em cidades menores, foram surgindo, Brasil afora, milhares de creches e pré-escolas comunitárias. Um número indefinido destas instituições conseguiu firmar convênios com organizações governamentais e não-governamentais, mas são muitas as que asseguram a sua sobrevivência graças à garra de seus educadores, à solidariedade de pequenos comerciantes locais e ao apoio de moradores das comunidades.

Para se ter idéia da situação, em 2001, estas instituições atendiam a mais da metade das crianças brasileiras de 0 a 3 anos que freqüentam creches no Brasil. Por esta razão, e pelo fato de prestarem serviços à população mais pobre do país, afirmamos que muitas das creches comunitárias são instituições públicas-não estatais! Elas se anteciparam aos governos municipais e estaduais no cumprimento do dever de assegurar o acesso a educação infantil onde não havia equipamentos estatais. Entretanto, caso o Congresso Nacional aprove a Medida Provisória nº 339, as crianças matriculadas nestas instituições comunitárias e beneficentes não terão acesso aos recursos do FUNDEB e continuarão como peças da economia informal, invisíveis para o poder público.

Se a Constituição Federal e a LDB afirmam o direito destas instituições aos recursos públicos; se o Brasil é um país de todos, como diz o nosso Presidente, então por que as crianças matriculadas em creches e pré-escolas comunitárias e beneficentes não terão direito aos recursos do FUNDEB?

O argumento que fundamentou o Artigo 8 da Medida Provisória nº 339 é o de que o repasse de recursos tem se constituído como mecanismo de evasão de verbas públicas para setores  privados. A nossa resposta a este argumento é a de que “público” não é sinônimo de “estatal”! Num país em que o Estado, historicamente, trabalhou a serviço do privado, a questão da evasão de recursos não pode ser resolvida através de simples corte, mas pelo estabelecimento de critérios que assegurem transparência ao repasse e inaugurem novas relações entre estado e sociedade.

Sr Presidente, D. Marisa, Srs congressistas e governantes estaduais e municipais, cidadãs e cidadãos brasileiros! Nosso Movimento de Luta por Creche alimenta o sonho de que a lei maior de nosso país seja respeitada. Isto é, que independentemente de classe social, etnia, cultura ou gênero, todas as crianças gozem do direito de acesso a educação infantil; que todas as crianças sejam dignamente, carinhosamente, respeitosamente cuidadas e educadas, independentemente da natureza da instituição, entidade, ou grupo que realize e/ou assuma a responsabilidade do atendimento. 

Sem os recursos do FUNDEB, sem o apoio pedagógico e financeiro das Secretarias Municipais de Educação é impossível que creches comunitárias assegurem um serviço de qualidade para as crianças cujas famílias vêm sendo historicamente excluídas dos direitos mais elementares de cidadania.

Basta de convênios indignos, que alimentam com migalhas a sobrevivência das nossas creches. Não às políticas conservadoras, clientelistas e eleitoreiras que visam transformar as iniciativas populares em programas educacionais de baixo custo, que ampliam o atendimento, mas não asseguram qualidade. Não aos programas de atendimento que, em realidade, isentam o Estado e penalizam a parcela mais pobre da população! Queremos acesso aos recursos públicos! Queremos transparência nos mecanismos de repasse! Queremos ser incluídas nos processos de elaboração e definição de políticas públicas voltadas para a Educação e a Assistência às crianças pequenas em nosso país. Temos o direito de ser incluídas nos programas do MEC voltados para a educação infantil!

Nesse sentido:
- pedimos aos congressistas a revisão do Art. 8 da Medida Provisória nº 339 de 28/12/06, com base nos art 213 da Constituição e o art. 77 da LDB,  que asseguram repasse de verbas para instituições comunitárias.
- pedimos ao Presidente Lula e à sua esposa, D. Marisa, que, pessoalmente, interfiram neste processo.
- solicitamos ao MEC, que convoque um amplo seminário dedicado ao debate de experiências de conveniamento e à discussão de critérios de financiamento e repasse de recursos.

Finalmente, pedimos à instituições, entidades e movimentos sociais, assim como à cidadãos e cidadãs de boa vontade, que assinem esta carta, enviando uma mensagem para crechelutacomunica@yahoo.com.br, com os seguintes dizeres:
“Nós, abaixo assinados, concordamos com os termos da Carta Aberta e, junto com suas autoras, pedimos aos governantes do país, em todas as instâncias, providências para que as creches comunitárias sejam incluídas entre as instituições passíveis de receber verbas do Fundeb.

Rio de Janeiro, fevereiro de 2007.
Movimento de Luta por Creche
Contato: crechelutacomunica@yahoo.com.br

Participam  e/ou apoiam este movimento:
Rede de Educação Infantil Comunitária; Núcleo de Creches e Pre-escolas Comunitárias da Baixada Fluminense (NUCREP); Articulação de creches de São Gonçalo (Art-Creche); Solidariedade França Brasil (SFB); Centro de Assessoria ao Mov. Popular (CAMPO); Fundação Fé e Alegria; Instituto Idéias; Organização Mundial de Educação Pré-Escolar  (OMEP); Ação Social Pe. Anchieta (ASPA); Centro de Criação de Imagem Popular (CECIP); Fórum de Educação Infantil do Rio de Janeiro; Creche da Fundação Osvaldo Cruz; Léa Tiriba (PUC/RJ); Adriani Pinheiro Freire (assessora pedagógica); Zoia Prestes (educadora); Rita Coelho (MIEIB); NEI:P&E (Núcleo de Estudos da Infância: Pesquisa & Extensão/UERJ); Vera M.R. de Vasconcellos (UERJ/RJ); Deise Nunes (UFF); Patrícia Corsino (UFRJ); Fernanda Nunes (UNIRIO/PUC-RJ).


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