21/09/2005 Undime
Caracterização do município - O município de Sobral, situado na Região Noroeste do Estado do Ceará, a 230km de Fortaleza, é tombado como Patrimônio Histórico e Artístico Nacional por seu importante acervo arquitetônico, histórico e cultural. Apresenta uma extensão territorial de 2.129Km², o que representa 1,48% do território estadual. Conforme o censo do IBGE do ano de 2000, a população de Sobral se constitui de 155.276 habitantes e, de acordo com projeção também do IBGE, em 2004, a população já é equivalente a 166.543 habitantes. Esta projeção também indica que, deste número de habitantes, 76.339 têm menos de 20 anos de idade, que representa 45,83% da população. Ao se considerar até os 39 anos de idade, este número passa para 128.989 habitantes, 77,45% da população. Portanto, temos uma população predominantemente jovem que demanda um significativo investimento na área da educação.
Na Educação Básica, conforme dados do Censo Escolar de 2004, o município possui uma matrícula total de 65.095 alunos, sendo que 31.997 (49,15%) concentram-se na rede municipal de ensino. Da matrícula total do município, 39.572 constitui o ensino fundamental, sendo 24.832 a matrícula efetivada na rede municipal (62,75%). Considerando a matrícula total da rede municipal, observa-se que 77,60% concentra-se no ensino fundamental. É importante ressaltar que o município de Sobral, desde 2001, ampliou o ensino fundamental para nove anos. O atendimento às crianças de seis anos, portanto, está incluído na matrícula do ensino fundamental.
Situação educacional - A universalização do acesso à escola das crianças de 6 a 14 anos é uma meta que, em Sobral, pode-se dizer que já foi atingida. Conforme dados do Censo Escolar, a taxa de escolarização líquida no ensino fundamental, em 2003, foi de 100,16%. Isto se justifica pelo fato de que Sobral é um município pólo da região norte, para onde converge a população de municípios vizinhos em busca de trabalho. Todas as crianças (ou quase todas) desta faixa etária estão na escola. O grande desafio que se coloca é a permanência com sucesso destas crianças no espaço escolar. Neste caso, sucesso é sinônimo de aprendizagem; e um processo de escolarização exitoso não pode prescindir da leitura e da escrita como instrumentos fundamentais de aprendizagem. Neste sentido, aprender a ler e escrever, no início da escolarização, é uma condição básica para que se abra uma perspectiva de sucesso ao longo da experiência escolar posterior.
Um dos resultados que denuncia imediatamente a fragilidade do sistema escolar é o índice de alfabetização de crianças. De uma maneira geral a escola pública, em grande parte de nosso país, não está conseguindo alfabetizar seus alunos. E não é difícil imaginar o conflito de um aluno que, ao longo das séries do ensino fundamental, já tornando-se um(a) adolescente, não sabe ler. Eles usam alguns artifícios para lidar com a situação, mas terminam por render-se à absoluta falta de significado das tarefas e rotinas escolares e abandonam a fé em si mesmos e/ou abandonam a escola. Infelizmente, esta é a realidade brasileira. Conforme Araújo e Luzio (2004) , a última avaliação feita pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) mostra que 55% das crianças que freqüentavam a 4ª série do ensino fundamental, em 2003, têm uma competência de leitura muito abaixo de um nível considerado apropriado à série. Apresentam graves dificuldades em ler textos simples, curtos, escritos na ordem direta. Também têm dificuldade para encontrar, em tais textos, as informações explícitas. Ao observarmos estes resultados por região, constatamos que, no Nordeste, esta situação se agrava drasticamente, como se verifica também em Araújo e Luzio (2004) : a soma dos níveis muito crítico e crítico, em Leitura, ou seja, os que estão abaixo do mínimo esperado para a 4ª série, totaliza 75% das crianças. No Sul, esse grupo representa 47% e, no Sudeste, 44%.
Em Sobral, a avaliação de aprendizagem realizada ao final de 2000 mostrou que os resultados das escolas municipais faziam um trágico coro com os da realidade educacional brasileira, especialmente das regiões mais pobres do país. Foram avaliados 75% dos alunos que estavam concluindo a 2ª série do ensino fundamental e o resultado desta avaliação mostrou que 48% destas crianças não dominavam as habilidades iniciais da leitura, ou seja, não conseguiam transformar letras em sons. As crianças e jovens não estavam aprendendo nas escolas públicas. Vendo a outra face da moeda: as escolas públicas não estavam ensinando às crianças e jovens com suficiência.
A gravidade da situação se comprovou com os diagnósticos do início de 2001, onde constatou-se que praticamente 50% dos alunos de 2ª a 4ª série não sabiam ler. O município tinha indicadores favoráveis (que, sem sombra de dúvida, representavam avanços importantes) mas que não minimizam o lado dramático da situação. Tínhamos quase 100% de crianças e jovens na escola, mas eles não estavam aprendendo nem mesmo a ler e escrever. O índice de abandono diminuía, mas o absenteísmo era altíssimo. Havia um investimento em programas de correção de fluxo escolar, mas a principal torneira de onde jorra o problema estava aberta porque os alunos não se alfabetizavam na idade certa. Na verdade as crianças de 6 anos, atendidas em pré-escolas, terminavam o ano letivo sem realizar os primeiros atos de leitura e escrita com autonomia e um grande número continuava assim na 1ª, 2ª, 3ª, 4ª série do ensino fundamental, comprometendo irreversivelmente o seu processo de escolarização.
Política de alfabetização
Diante deste diagnóstico, a Secretaria de Desenvolvimento da Educação definiu a alfabetização como prioridade da gestão 2001/2004, que demandou a implantação de uma política de alfabetização com as principais diretrizes e ações posteriormente garantidas em lei municipal.
- Ampliação do ensino fundamental para 9 anos, com a inclusão do atendimento das crianças de 6 anos enturmadas em uma série específica denominada 1ª série básica;
-Lotação criteriosa de professores para as salas de alfabetização e acompanhamento permanente dos resultados;
- Programa de formação continuada para todos os professores que garante a aplicação de rotinas pedagógicas voltadas para o programa de ensino;
- Garantia de gratificação salarial para professores titulares das salas de alfabetização de acordo com critérios estabelecidos pela Secretaria;
- Avaliação externa semestral de todos os alunos em processo de alfabetização e a criação de um sistema informatizado para análise de dados;
- Estabelecimento do prêmio Escola Alfabetizadora;
- Eliminação do analfabetismo de 2ª a 4ª série na rede municipal;
- O envolvimento da comunidade escolar, especialmente os pais.
Pelo caráter de prioridade, as diretrizes e metas de aprendizagem foram estabelecidas pela Secretaria de Desenvolvimento da Educação, sendo incorporadas ao plano de desenvolvimento das escolas. A gestão pedagógica da escola é de responsabilidade do diretor e da equipe composta por ele. Para isso conta com o acompanhamento e apoio da Secretaria, e a ela presta contas sobre os resultados alcançados pela escola. No desenvolvimento das ações, um dos “paradigmas” que, pouco a pouco, ia sendo transformado era a crença de que o desempenho das crianças da escola pública é refém da situação econômica desfavorecida e de todo o cortejo de desvantagens que advém da condição de pobreza. Em outras palavras, é necessário mudar o discurso de que “criança pobre não aprende”.
O papel da avaliação externa na política de alfabetização
A sistemática de avaliação externa à escola dos resultados de alfabetização da rede municipal surge, em 2001, como um componente da política de alfabetização do município. Tem como objetivo principal diagnosticar o estado atual de desenvolvimento da leitura e da escrita das crianças de seis e sete anos matriculadas, respectivamente, na 1ª série básica e 1ª série regular do ensino fundamental. Também são avaliados os alunos matriculados de 2ª a 4ª série e enturmados em salas de alfabetização.
A avaliação externa configurou-se num instrumento gerencial imprescindível para o acompanhamento e para realização das intervenções necessárias ao processo de consecução das metas. Os resultados (obtidos através de critérios universais, suficientemente objetivos e com um nível satisfatório de controle) iam para a mesa de análise, onde a construção (e desconstrução) de hipóteses culminavam na definição de estratégias para fazer frente aos desafios, tanto do ponto de vista da rede quanto de cada escola, de cada turma, de cada aluno. Esse processo, coordenado pela superintendência escolar e pela coordenação de séries iniciais, tinha a efetiva participação do diretor e de sua equipe de coordenação pedagógica.
A concepção de alfabetização e a avaliação externa - Inicialmente, é importante situar, embora com brevidade, a concepção acerca do processo de aprendizagem da leitura e da escrita que norteia a política de alfabetização de Sobral. Hoje já não há mais dúvidas quanto ao caráter processual da aprendizagem da leitura. A possibilidade de lidar, desde os primeiros anos, com uma rede de atos significativos de leitura e escrita favorece a compreensão da criança quanto à função, ao valor e às características da escrita e isso tem repercussões positivas na aprendizagem subseqüente.
No entanto, por volta de 6 anos, e isso nos mostra também a experiência, a criança é capaz de dominar informações importantes sobre o sistema alfabético, ou seja, sobre como a escrita representa a linguagem. Ela consegue, então, ler e escrever os primeiros textos com certa autonomia. É bem sabido que ler e escrever não se reduzem a habilidades de codificação e decodificação. O leitor deve ser capaz de fazer uso real e adequado da escrita com todas as funções que ela tem em nossa sociedade, inclusive usar a leitura e a escrita para aprender. Portanto, se aos 6 anos é possível e desejável que aconteça um passo importante com relação ao conhecimento do sistema alfabético, é ao longo dos anos seguintes que a formação do leitor se consolida.
No entanto, entender que aprender a ler é um processo que envolve, inclusive, ritmos individuais, não deve mascarar as situações de ineficiência do trabalho escolar, nem tampouco justificar pretensos programas de ensino com muitas palavras bonitas, mas com rotas e metas indefinidas. As aquisições das competências precisam acontecer de maneira eficaz ao longo de cada tempo escolar. Os desafios no ensino fundamental ainda são muito grandes e não permitem ao município desviar o foco de prioridade nesta etapa do ensino básico. Incluir as crianças de 6 anos no ensino fundamental, tornando este atendimento universal e obrigatório, com um programa de ensino específico e metas de aprendizagem estabelecidas, é colocá-las sob o foco das prioridades do município. Ao tempo em que garante às crianças os estímulos necessários ao seu desenvolvimento social, afetivo, psicomotor e cognitivo, introduz uma ação pedagógica efetiva de alfabetização que, de outro modo, iria acontecer de forma mais estruturada na 1ª série (somente aos 7 anos). Isso comprometeria as metas esperadas ao final dos 8 anos (atual 2ª série) que é a leitura com uma fluência de aproximadamente 90 palavras por minuto, e a capacidade de interpretar textos mais longos e com uma complexidade crescente.
A realidade em Sobral mostrava que os alunos estavam prosseguindo no ensino fundamental sem sequer ter adquirido as habilidades que podem ser consideradas iniciais no processo de conhecimento do sistema alfabético. Os alunos não eram capazes de fazer a junção de fonemas para ler palavras simples. Diante disso, como conceber a proposta de avaliação externa? Conscientes de que uma sistemática de avaliação externa à escola seria imprescindível para o gerenciamento da política de alfabetização, chegou-se à decisão sobre o que, exatamente, seria avaliado: o desenvolvimento da aquisição da leitura e da escrita das crianças de seis e sete anos, focando no aspecto físico da linguagem escrita, ou seja, na sua superfície ou estrutura aparente que, conforme Smith (1989, p. 42) , constitui a informação visual da linguagem escrita. Isto porque este aspecto da linguagem permitiria maior objetividade no controle e acompanhamento da política de alfabetização. A opção por focar a avaliação na estrutura aparente da linguagem, ou seja, em sua superfície, não implica em desconsiderarmos a importância de sua estrutura profunda que, ainda conforme Smith, é a parte da linguagem que não pode ser nem diretamente observada nem medida, e esta parte é o significado. Diante desta opção, foram definidos os procedimentos e instrumentos a serem utilizados na avaliação externa.
Procedimentos da avaliação externa
No Brasil não é usual a existência de instrumentos validados para avaliação de sistema da alfabetização inicial das crianças. O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB) avalia o processo de leitura consolidado ao final das séries iniciais do ensino fundamental. A necessidade em Sobral era avaliar os dois primeiros anos, a etapa inicial. Havia de se considerar, inclusive, o leque de possibilidades desta etapa em termos de ritmos individuais. Diante desta realidade, e conforme a opção sobre o que avaliar, a equipe aventurou-se na criação de um procedimento próprio. Vale salientar que os procedimentos metodológicos da sistemática de avaliação externa da alfabetização de Sobral são simples e precisam ser analisados e validados por especialistas da área, bem como por aplicações em outros municípios. Para a experiência da rede municipal, com as necessidades do momento, foram considerados procedimentos válidos que atenderam às expectativas pela confiabilidade para a coleta e também pelas informações produzidas acerca do desempenho dos alunos.
A definição dos procedimentos e instrumentos se referenciou naqueles utilizados na avaliação realizada em 2000 com alunos da então 2ª série do ensino fundamental da rede municipal de Sobral, coordenada pelo Professor Edgar Linhares . Em síntese, a sistemática de avaliação externa se constitui da gravação da leitura oral, em caráter de entrevista individual, das crianças em processo de alfabetização. No ato da avaliação,m solicita-se a cada criança que leia o material apresentado numa determinada seqüência (palavras e frases isoladas e um pequeno texto). Conforme o desempenho, a criança é considerada “leitora de texto“ , “leitora de frases“, “leitora de palavras“, “leitora de sílabas“ ou “não leitora“. Esta avaliação é realizada ao final de cada semestre letivo, ou seja, duas vezes por ano. Uma equipe de avaliadores selecionada entre alunos e egressos dos cursos de lincenciatura da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA é responsável pela aplicação da avaliação. Todo o processo de coordenação, execução e consolidadação dos resultados é feito pela equipe da Coordenação de Ensino Fundamental (séries iniciais) da Secretaria de Educação do Município. Existe um guia de orientações sobre a aplicação de todo o processo da avaliação em que se busca padronizar as orientações e as formas de registro dos dados coletados. Todas as gravações são ouvidas por uma equipe (grupo da audição) que tem a tarefa de checar os registros feitos pelo aplicador, identificando possíveis erros ou incongruências que possam por em dúvida o registro avaliativo da criança.
Vale ressaltar ainda que, antes de iniciar a aplicação dos instrumentos, o avaliador visita a escola para um contato inicial com as crianças e, no ato da avaliação, desenvolve algumas dinâmicas com a criança de modo a criar um vínculo positivo e, assim, minimizar o caráter ameaçador que as avaliações suscitam.
Os instrumentos utilizados na avaliação externa - A sistemática de avaliação externa da alfabetização está focada na informação visual da linguagem escrita, ou seja, na sua superfície. Em função disso, a opção por desenvolver o procedimento de gravação da leitura de cada aluno. Desta forma, os instrumentos de avaliação da leitura se constituem de um elenco de palavras, de frases e de pequenos textos que são elaborados exclusivamente para cada aplicação da avaliação. Um instrumento de avaliação da escrita, aplicado em forma de ditado, também integra a avaliação de desempenho. No primeiro ano, 2001, avaliou-se apenas a leitura. A partir de 2002, passou-se a aplicar também o instrumento da escrita que se constituía de um ditado de quatro palavras e uma frase, tanto para as crianças de seis anos (1º série básica) quanto para as de sete (1ª série regular). A partir de 2003, em função dos resultados, foi aplicado um texto para as crianças do 1ª série regular.
Inicialmente, analisou-se a possibilidade da utilização de instrumentos constituídos por itens (múltipla escolha, por exemplo) que fossem respondidos pelos alunos. Entretanto, o fato destes instrumentos envolverem um conjunto de variáveis que levariam em conta as múltiplas habilidades leitoras (e aqui não se desconsidera a importância de todas) não atenderiam ao objetivo inicial que seria monitorar o avanço da aprendizagem das habilidades iniciais de domínio do sistema alfabético. A elaboração dos instrumentos - palavras, frases e textos - tem por base alguns princípios de gradação e legibilidade, considerando o público alvo e a opção sobre o que seria avaliado. Assim, o elenco de palavras isoladas envolve na mesma proporção monossílabos, dissílabos e trissílabos, tanto constituídos apenas por sílabas simples quanto por sílabas simples e complexas. As frases são curtas, na ordem direta, envolvendo, em maior proporção, palavras com sílabas simples. Os textos são curtos, constituídos, em geral, por 55 palavras, predominantemente por frases curtas e em ordem direta.
Os resultados da avaliação - Os resultados alcançados pelas escolas municipais de Sobral na alfabetização das crianças de 6 e 7 anos são muito importantes. O gráfico abaixo ilustra a evolução da aprendizagem das crianças no período de 2001 a 2004, em que foram submetidas ao mesmo procedimento de avaliação. É importante lembrar que a totalidade desse grupo, até 2000, terminava o ano sem saber ler. São crianças de 6 (1ª série básica) e 7 anos (1ª série regular) que, hoje, já têm uma perspectiva de sucesso para continuidade de seu processo de escolarização. No entanto, é absolutamente claro que esse é um passo inicial do processo. Ainda há desafios importantíssimos tanto com relação à qualificação do processo de alfabetização inicial, quanto com relação à consolidação das competências de um bom leitor que se dá ao longo das séries iniciais do ensino fundamental. As novas metas serão definidas e, com elas, a modificação dos instrumentos de avaliação externa para a avaliação de desempenho em leitura.
Registra-se também que a avaliação externa, desde 2003, já foi aplicada nas demais séries do ensino fundamental, sendo a 4ª série avaliada universalmente com itens do SAEB, através de convênio com o INEP. Atualmente, através da ampliação deste convênio, está sendo desenvolvido um sistema informatizado para processamento, integração e análise de todas as bases de dados geradas pelas avaliações de resultados de aprendizagem dos alunos. Este sistema vem sendo integralmente desenvolvido na base de softwares gratuitos e abertos, que podem ser disponibilizados a todos os sistemas de ensino que se interessarem pelo seu uso. Além do uso pedagógico e gerencial que a sistemática de avaliação externa já tem proporcionado, o sistema em desenvolvimento abre possibilidades de uso científico seja através de pesquisas realizadas pela própria rede, seja através de parcerias com profissionais de universidades e outros organismos de pesquisas.
Consideração finais
A avaliação externa mostrou-se um instrumento imprescindível para subsidiar a política da secretaria de educação, destacando-se o importante desdobramento para a gestão escolar. Pode-se afirmar, sem dúvida alguma, que esta estratégia impactou positivamente todo o sistema, com repercussões na cultura gerencial da Secretaria e das escolas, inclusive na gestão pedagógica da sala de aula. A partir da experiência da avaliação externa, já é possível registrar o refinamento das estratégias de avaliação processual das escolas, no monitoramento do processo de alfabetização das crianças.
Superadas as resistências do primeiro momento (motivadas também pela desconfiança e temor que as avaliações causam em algumas situações) a gestão municipal e escolar pode “tirar os bons proveitos” das informações e das possibilidades de análises consistentes que a avaliação externa oferece. Em Sobral, a avaliação externa não é somente para a verificação do resultado final do ano letivo. Por ser realizada também ao final do primeiro semestre, permite a correção de rotas e a revisão de estratégias, tanto pela secretaria quanto pela escola, cumprindo o seu papel de instrumento gerencial.
Constitui-se numa experiência de fácil replicabilidade do ponto de vista técnico e não importa em acréscimos orçamentários demasiado onerosos sendo, até o momento, financiada com recursos próprios. Finalmente, é preciso a firme disposição de conhecer os resultados e publicá-los. A comunidade escolar, entendida num contexto mais amplo, precisa saber o que se passa na escola. Em Sobral, foi fundamental alardear aos quatro ventos do município que grande parte das crianças estava analfabeta ou semi-alfabetizada ao longo do ensino fundamental. Os “quatro ventos do município” representam todos aqueles que precisam conhecer a realidade com mais propriedade, tomar consciência da gravidade e responsabilizar-se pela parte que lhe cabe: gestores públicos, equipe técnica da secretaria, diretores das escolas e a equipe escolhida por eles, professores, pais, a universidade e a comunidade.
A experiência vivida em Sobral na gestão 2001/2004 nos dá evidências de que a potência que as pessoas mobilizam quando se comprometem verdadeiramente com suas metas está diretamente relacionada à tomada de consciência da realidade. Partir da realidade, por mais indesejável que ela seja e por mais custoso que nos pareça, é a condição imperiosa para que possamos intervir eficientemente e transformá-la. Isso vale até para as coisas da alma e é condição para a saúde. O sistema público de educação do Ceará precisa, portanto, olhar sem medo o reverso dos seus dados.
*Professora Isolda Cela Arruda Coelho da Secretaria de Educação de Sobral/ CE.
Caracterização do município - O município de Sobral, situado na Região Noroeste do Estado do Ceará, a 230km de Fortaleza, é tombado como Patrimônio Histórico e Artístico Nacional por seu importante acervo arquitetônico, histórico e cultural. Apresenta uma extensão territorial de 2.129Km², o que representa 1,48% do território estadual. Conforme o censo do IBGE do ano de 2000, a população de Sobral se constitui de 155.276 habitantes e, de acordo com projeção também do IBGE, em 2004, a população já é equivalente a 166.543 habitantes. Esta projeção também indica que, deste número de habitantes, 76.339 têm menos de 20 anos de idade, que representa 45,83% da população. Ao se considerar até os 39 anos de idade, este número passa para 128.989 habitantes, 77,45% da população. Portanto, temos uma população predominantemente jovem que demanda um significativo investimento na área da educação. Na Educação Básica, conforme dados do Censo Escolar de 2004, o município possui uma matrícula total de 65.095 alunos, sendo que 31.997 (49,15%) concentram-se na rede municipal de ensino. Da matrícula total do município, 39.572 constitui o ensino fundamental, sendo 24.832 a matrícula efetivada na rede municipal (62,75%). Considerando a matrícula total da rede municipal, observa-se que 77,60% concentra-se no ensino fundamental. É importante ressaltar que o município de Sobral, desde 2001, ampliou o ensino fundamental para nove anos. O atendimento às crianças de seis anos, portanto, está incluído na matrícula do ensino fundamental. Situação educacional - A universalização do acesso à escola das crianças de 6 a 14 anos é uma meta que, em Sobral, pode-se dizer que já foi atingida. Conforme dados do Censo Escolar, a taxa de escolarização líquida no ensino fundamental, em 2003, foi de 100,16%. Isto se justifica pelo fato de que Sobral é um município pólo da região norte, para onde converge a população de municípios vizinhos em busca de trabalho. Todas as crianças (ou quase todas) desta faixa etária estão na escola. O grande desafio que se coloca é a permanência com sucesso destas crianças no espaço escolar. Neste caso, sucesso é sinônimo de aprendizagem; e um processo de escolarização exitoso não pode prescindir da leitura e da escrita como instrumentos fundamentais de aprendizagem. Neste sentido, aprender a ler e escrever, no início da escolarização, é uma condição básica para que se abra uma perspectiva de sucesso ao longo da experiência escolar posterior. Um dos resultados que denuncia imediatamente a fragilidade do sistema escolar é o índice de alfabetização de crianças. De uma maneira geral a escola pública, em grande parte de nosso país, não está conseguindo alfabetizar seus alunos. E não é difícil imaginar o conflito de um aluno que, ao longo das séries do ensino fundamental, já tornando-se um(a) adolescente, não sabe ler. Eles usam alguns artifícios para lidar com a situação, mas terminam por render-se à absoluta falta de significado das tarefas e rotinas escolares e abandonam a fé em si mesmos e/ou abandonam a escola. Infelizmente, esta é a realidade brasileira. Conforme Araújo e Luzio (2004) , a última avaliação feita pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) mostra que 55% das crianças que freqüentavam a 4ª série do ensino fundamental, em 2003, têm uma competência de leitura muito abaixo de um nível considerado apropriado à série. Apresentam graves dificuldades em ler textos simples, curtos, escritos na ordem direta. Também têm dificuldade para encontrar, em tais textos, as informações explícitas. Ao observarmos estes resultados por região, constatamos que, no Nordeste, esta situação se agrava drasticamente, como se verifica também em Araújo e Luzio (2004) : a soma dos níveis muito crítico e crítico, em Leitura, ou seja, os que estão abaixo do mínimo esperado para a 4ª série, totaliza 75% das crianças. No Sul, esse grupo representa 47% e, no Sudeste, 44%. Em Sobral, a avaliação de aprendizagem realizada ao final de 2000 mostrou que os resultados das escolas municipais faziam um trágico coro com os da realidade educacional brasileira, especialmente das regiões mais pobres do país. Foram avaliados 75% dos alunos que estavam concluindo a 2ª série do ensino fundamental e o resultado desta avaliação mostrou que 48% destas crianças não dominavam as habilidades iniciais da leitura, ou seja, não conseguiam transformar letras em sons. As crianças e jovens não estavam aprendendo nas escolas públicas. Vendo a outra face da moeda: as escolas públicas não estavam ensinando às crianças e jovens com suficiência. A gravidade da situação se comprovou com os diagnósticos do início de 2001, onde constatou-se que praticamente 50% dos alunos de 2ª a 4ª série não sabiam ler. O município tinha indicadores favoráveis (que, sem sombra de dúvida, representavam avanços importantes) mas que não minimizam o lado dramático da situação. Tínhamos quase 100% de crianças e jovens na escola, mas eles não estavam aprendendo nem mesmo a ler e escrever. O índice de abandono diminuía, mas o absenteísmo era altíssimo. Havia um investimento em programas de correção de fluxo escolar, mas a principal torneira de onde jorra o problema estava aberta porque os alunos não se alfabetizavam na idade certa. Na verdade as crianças de 6 anos, atendidas em pré-escolas, terminavam o ano letivo sem realizar os primeiros atos de leitura e escrita com autonomia e um grande número continuava assim na 1ª, 2ª, 3ª, 4ª série do ensino fundamental, comprometendo irreversivelmente o seu processo de escolarização.Política de alfabetizaçãoDiante deste diagnóstico, a Secretaria de Desenvolvimento da Educação definiu a alfabetização como prioridade da gestão 2001/2004, que demandou a implantação de uma política de alfabetização com as principais diretrizes e ações posteriormente garantidas em lei municipal. - Ampliação do ensino fundamental para 9 anos, com a inclusão do atendimento das crianças de 6 anos enturmadas em uma série específica denominada 1ª série básica;-Lotação criteriosa de professores para as salas de alfabetização e acompanhamento permanente dos resultados;- Programa de formação continuada para todos os professores que garante a aplicação de rotinas pedagógicas voltadas para o programa de ensino; - Garantia de gratificação salarial para professores titulares das salas de alfabetização de acordo com critérios estabelecidos pela Secretaria; - Avaliação externa semestral de todos os alunos em processo de alfabetização e a criação de um sistema informatizado para análise de dados; - Estabelecimento do prêmio Escola Alfabetizadora; - Eliminação do analfabetismo de 2ª a 4ª série na rede municipal; - O envolvimento da comunidade escolar, especialmente os pais. Pelo caráter de prioridade, as diretrizes e metas de aprendizagem foram estabelecidas pela Secretaria de Desenvolvimento da Educação, sendo incorporadas ao plano de desenvolvimento das escolas. A gestão pedagógica da escola é de responsabilidade do diretor e da equipe composta por ele. Para isso conta com o acompanhamento e apoio da Secretaria, e a ela presta contas sobre os resultados alcançados pela escola. No desenvolvimento das ações, um dos “paradigmas” que, pouco a pouco, ia sendo transformado era a crença de que o desempenho das crianças da escola pública é refém da situação econômica desfavorecida e de todo o cortejo de desvantagens que advém da condição de pobreza. Em outras palavras, é necessário mudar o discurso de que “criança pobre não aprende”. O papel da avaliação externa na política de alfabetização A sistemática de avaliação externa à escola dos resultados de alfabetização da rede municipal surge, em 2001, como um componente da política de alfabetização do município. Tem como objetivo principal diagnosticar o estado atual de desenvolvimento da leitura e da escrita das crianças de seis e sete anos matriculadas, respectivamente, na 1ª série básica e 1ª série regular do ensino fundamental. Também são avaliados os alunos matriculados de 2ª a 4ª série e enturmados em salas de alfabetização. A avaliação externa configurou-se num instrumento gerencial imprescindível para o acompanhamento e para realização das intervenções necessárias ao processo de consecução das metas. Os resultados (obtidos através de critérios universais, suficientemente objetivos e com um nível satisfatório de controle) iam para a mesa de análise, onde a construção (e desconstrução) de hipóteses culminavam na definição de estratégias para fazer frente aos desafios, tanto do ponto de vista da rede quanto de cada escola, de cada turma, de cada aluno. Esse processo, coordenado pela superintendência escolar e pela coordenação de séries iniciais, tinha a efetiva participação do diretor e de sua equipe de coordenação pedagógica. A concepção de alfabetização e a avaliação externa - Inicialmente, é importante situar, embora com brevidade, a concepção acerca do processo de aprendizagem da leitura e da escrita que norteia a política de alfabetização de Sobral. Hoje já não há mais dúvidas quanto ao caráter processual da aprendizagem da leitura. A possibilidade de lidar, desde os primeiros anos, com uma rede de atos significativos de leitura e escrita favorece a compreensão da criança quanto à função, ao valor e às características da escrita e isso tem repercussões positivas na aprendizagem subseqüente. No entanto, por volta de 6 anos, e isso nos mostra também a experiência, a criança é capaz de dominar informações importantes sobre o sistema alfabético, ou seja, sobre como a escrita representa a linguagem. Ela consegue, então, ler e escrever os primeiros textos com certa autonomia. É bem sabido que ler e escrever não se reduzem a habilidades de codificação e decodificação. O leitor deve ser capaz de fazer uso real e adequado da escrita com todas as funções que ela tem em nossa sociedade, inclusive usar a leitura e a escrita para aprender. Portanto, se aos 6 anos é possível e desejável que aconteça um passo importante com relação ao conhecimento do sistema alfabético, é ao longo dos anos seguintes que a formação do leitor se consolida. No entanto, entender que aprender a ler é um processo que envolve, inclusive, ritmos individuais, não deve mascarar as situações de ineficiência do trabalho escolar, nem tampouco justificar pretensos programas de ensino com muitas palavras bonitas, mas com rotas e metas indefinidas. As aquisições das competências precisam acontecer de maneira eficaz ao longo de cada tempo escolar. Os desafios no ensino fundamental ainda são muito grandes e não permitem ao município desviar o foco de prioridade nesta etapa do ensino básico. Incluir as crianças de 6 anos no ensino fundamental, tornando este atendimento universal e obrigatório, com um programa de ensino específico e metas de aprendizagem estabelecidas, é colocá-las sob o foco das prioridades do município. Ao tempo em que garante às crianças os estímulos necessários ao seu desenvolvimento social, afetivo, psicomotor e cognitivo, introduz uma ação pedagógica efetiva de alfabetização que, de outro modo, iria acontecer de forma mais estruturada na 1ª série (somente aos 7 anos). Isso comprometeria as metas esperadas ao final dos 8 anos (atual 2ª série) que é a leitura com uma fluência de aproximadamente 90 palavras por minuto, e a capacidade de interpretar textos mais longos e com uma complexidade crescente. A realidade em Sobral mostrava que os alunos estavam prosseguindo no ensino fundamental sem sequer ter adquirido as habilidades que podem ser consideradas iniciais no processo de conhecimento do sistema alfabético. Os alunos não eram capazes de fazer a junção de fonemas para ler palavras simples. Diante disso, como conceber a proposta de avaliação externa? Conscientes de que uma sistemática de avaliação externa à escola seria imprescindível para o gerenciamento da política de alfabetização, chegou-se à decisão sobre o que, exatamente, seria avaliado: o desenvolvimento da aquisição da leitura e da escrita das crianças de seis e sete anos, focando no aspecto físico da linguagem escrita, ou seja, na sua superfície ou estrutura aparente que, conforme Smith (1989, p. 42) , constitui a informação visual da linguagem escrita. Isto porque este aspecto da linguagem permitiria maior objetividade no controle e acompanhamento da política de alfabetização. A opção por focar a avaliação na estrutura aparente da linguagem, ou seja, em sua superfície, não implica em desconsiderarmos a importância de sua estrutura profunda que, ainda conforme Smith, é a parte da linguagem que não pode ser nem diretamente observada nem medida, e esta parte é o significado. Diante desta opção, foram definidos os procedimentos e instrumentos a serem utilizados na avaliação externa. Procedimentos da avaliação externa No Brasil não é usual a existência de instrumentos validados para avaliação de sistema da alfabetização inicial das crianças. O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB) avalia o processo de leitura consolidado ao final das séries iniciais do ensino fundamental. A necessidade em Sobral era avaliar os dois primeiros anos, a etapa inicial. Havia de se considerar, inclusive, o leque de possibilidades desta etapa em termos de ritmos individuais. Diante desta realidade, e conforme a opção sobre o que avaliar, a equipe aventurou-se na criação de um procedimento próprio. Vale salientar que os procedimentos metodológicos da sistemática de avaliação externa da alfabetização de Sobral são simples e precisam ser analisados e validados por especialistas da área, bem como por aplicações em outros municípios. Para a experiência da rede municipal, com as necessidades do momento, foram considerados procedimentos válidos que atenderam às expectativas pela confiabilidade para a coleta e também pelas informações produzidas acerca do desempenho dos alunos. A definição dos procedimentos e instrumentos se referenciou naqueles utilizados na avaliação realizada em 2000 com alunos da então 2ª série do ensino fundamental da rede municipal de Sobral, coordenada pelo Professor Edgar Linhares . Em síntese, a sistemática de avaliação externa se constitui da gravação da leitura oral, em caráter de entrevista individual, das crianças em processo de alfabetização. No ato da avaliação,m solicita-se a cada criança que leia o material apresentado numa determinada seqüência (palavras e frases isoladas e um pequeno texto). Conforme o desempenho, a criança é considerada “leitora de texto“ , “leitora de frases“, “leitora de palavras“, “leitora de sílabas“ ou “não leitora“. Esta avaliação é realizada ao final de cada semestre letivo, ou seja, duas vezes por ano. Uma equipe de avaliadores selecionada entre alunos e egressos dos cursos de lincenciatura da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA é responsável pela aplicação da avaliação. Todo o processo de coordenação, execução e consolidadação dos resultados é feito pela equipe da Coordenação de Ensino Fundamental (séries iniciais) da Secretaria de Educação do Município. Existe um guia de orientações sobre a aplicação de todo o processo da avaliação em que se busca padronizar as orientações e as formas de registro dos dados coletados. Todas as gravações são ouvidas por uma equipe (grupo da audição) que tem a tarefa de checar os registros feitos pelo aplicador, identificando possíveis erros ou incongruências que possam por em dúvida o registro avaliativo da criança. Vale ressaltar ainda que, antes de iniciar a aplicação dos instrumentos, o avaliador visita a escola para um contato inicial com as crianças e, no ato da avaliação, desenvolve algumas dinâmicas com a criança de modo a criar um vínculo positivo e, assim, minimizar o caráter ameaçador que as avaliações suscitam. Os instrumentos utilizados na avaliação externa - A sistemática de avaliação externa da alfabetização está focada na informação visual da linguagem escrita, ou seja, na sua superfície. Em função disso, a opção por desenvolver o procedimento de gravação da leitura de cada aluno. Desta forma, os instrumentos de avaliação da leitura se constituem de um elenco de palavras, de frases e de pequenos textos que são elaborados exclusivamente para cada aplicação da avaliação. Um instrumento de avaliação da escrita, aplicado em forma de ditado, também integra a avaliação de desempenho. No primeiro ano, 2001, avaliou-se apenas a leitura. A partir de 2002, passou-se a aplicar também o instrumento da escrita que se constituía de um ditado de quatro palavras e uma frase, tanto para as crianças de seis anos (1º série básica) quanto para as de sete (1ª série regular). A partir de 2003, em função dos resultados, foi aplicado um texto para as crianças do 1ª série regular. Inicialmente, analisou-se a possibilidade da utilização de instrumentos constituídos por itens (múltipla escolha, por exemplo) que fossem respondidos pelos alunos. Entretanto, o fato destes instrumentos envolverem um conjunto de variáveis que levariam em conta as múltiplas habilidades leitoras (e aqui não se desconsidera a importância de todas) não atenderiam ao objetivo inicial que seria monitorar o avanço da aprendizagem das habilidades iniciais de domínio do sistema alfabético. A elaboração dos instrumentos - palavras, frases e textos - tem por base alguns princípios de gradação e legibilidade, considerando o público alvo e a opção sobre o que seria avaliado. Assim, o elenco de palavras isoladas envolve na mesma proporção monossílabos, dissílabos e trissílabos, tanto constituídos apenas por sílabas simples quanto por sílabas simples e complexas. As frases são curtas, na ordem direta, envolvendo, em maior proporção, palavras com sílabas simples. Os textos são curtos, constituídos, em geral, por 55 palavras, predominantemente por frases curtas e em ordem direta. Os resultados da avaliação - Os resultados alcançados pelas escolas municipais de Sobral na alfabetização das crianças de 6 e 7 anos são muito importantes. O gráfico abaixo ilustra a evolução da aprendizagem das crianças no período de 2001 a 2004, em que foram submetidas ao mesmo procedimento de avaliação. É importante lembrar que a totalidade desse grupo, até 2000, terminava o ano sem saber ler. São crianças de 6 (1ª série básica) e 7 anos (1ª série regular) que, hoje, já têm uma perspectiva de sucesso para continuidade de seu processo de escolarização. No entanto, é absolutamente claro que esse é um passo inicial do processo. Ainda há desafios importantíssimos tanto com relação à qualificação do processo de alfabetização inicial, quanto com relação à consolidação das competências de um bom leitor que se dá ao longo das séries iniciais do ensino fundamental. As novas metas serão definidas e, com elas, a modificação dos instrumentos de avaliação externa para a avaliação de desempenho em leitura. Registra-se também que a avaliação externa, desde 2003, já foi aplicada nas demais séries do ensino fundamental, sendo a 4ª série avaliada universalmente com itens do SAEB, através de convênio com o INEP. Atualmente, através da ampliação deste convênio, está sendo desenvolvido um sistema informatizado para processamento, integração e análise de todas as bases de dados geradas pelas avaliações de resultados de aprendizagem dos alunos. Este sistema vem sendo integralmente desenvolvido na base de softwares gratuitos e abertos, que podem ser disponibilizados a todos os sistemas de ensino que se interessarem pelo seu uso. Além do uso pedagógico e gerencial que a sistemática de avaliação externa já tem proporcionado, o sistema em desenvolvimento abre possibilidades de uso científico seja através de pesquisas realizadas pela própria rede, seja através de parcerias com profissionais de universidades e outros organismos de pesquisas. Consideração finaisA avaliação externa mostrou-se um instrumento imprescindível para subsidiar a política da secretaria de educação, destacando-se o importante desdobramento para a gestão escolar. Pode-se afirmar, sem dúvida alguma, que esta estratégia impactou positivamente todo o sistema, com repercussões na cultura gerencial da Secretaria e das escolas, inclusive na gestão pedagógica da sala de aula. A partir da experiência da avaliação externa, já é possível registrar o refinamento das estratégias de avaliação processual das escolas, no monitoramento do processo de alfabetização das crianças. Superadas as resistências do primeiro momento (motivadas também pela desconfiança e temor que as avaliações causam em algumas situações) a gestão municipal e escolar pode “tirar os bons proveitos” das informações e das possibilidades de análises consistentes que a avaliação externa oferece. Em Sobral, a avaliação externa não é somente para a verificação do resultado final do ano letivo. Por ser realizada também ao final do primeiro semestre, permite a correção de rotas e a revisão de estratégias, tanto pela secretaria quanto pela escola, cumprindo o seu papel de instrumento gerencial. Constitui-se numa experiência de fácil replicabilidade do ponto de vista técnico e não importa em acréscimos orçamentários demasiado onerosos sendo, até o momento, financiada com recursos próprios. Finalmente, é preciso a firme disposição de conhecer os resultados e publicá-los. A comunidade escolar, entendida num contexto mais amplo, precisa saber o que se passa na escola. Em Sobral, foi fundamental alardear aos quatro ventos do município que grande parte das crianças estava analfabeta ou semi-alfabetizada ao longo do ensino fundamental. Os “quatro ventos do município” representam todos aqueles que precisam conhecer a realidade com mais propriedade, tomar consciência da gravidade e responsabilizar-se pela parte que lhe cabe: gestores públicos, equipe técnica da secretaria, diretores das escolas e a equipe escolhida por eles, professores, pais, a universidade e a comunidade. A experiência vivida em Sobral na gestão 2001/2004 nos dá evidências de que a potência que as pessoas mobilizam quando se comprometem verdadeiramente com suas metas está diretamente relacionada à tomada de consciência da realidade. Partir da realidade, por mais indesejável que ela seja e por mais custoso que nos pareça, é a condição imperiosa para que possamos intervir eficientemente e transformá-la. Isso vale até para as coisas da alma e é condição para a saúde. O sistema público de educação do Ceará precisa, portanto, olhar sem medo o reverso dos seus dados. *Professora Isolda Cela Arruda Coelho da Secretaria de Educação de Sobral/ CE.