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25/04/2003 Undime

Modificar o ECA é uma sugestão descabida

Manifesto

As organizações abaixo-assinadas vêm a público manifestar sua indignação em relação à proposta do governador Geraldo Alckmin de mudanças no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Nós, adultos, somos os responsáveis por criar as condições para que estes jovens rompam um ciclo de violência e retornem ao convívio social e ao exercício pleno de sua cidadania. É inadmissível culpá-los por não estarmos sendo capazes de assegurar estes objetivos. É inadmissível questionar os direitos conquistados através do ECA para escamotear a nossa ineficiência.

Com relação às declarações que vêm sendo feitas por membros do Governo de São Paulo e da direção da Febem, consideramos que está sendo transmitida à sociedade uma falsa idéia sobre qual é de fato o problema.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é comprovadamente rigoroso e funciona

1. O ECA não é complacente, não é permissivo e não é ineficaz, nem favorece a impunidade de jovens infratores.

O Estatuto da Criança e do Adolescente determina medidas contra os atos infracionais cometidos por adolescentes, com diversos níveis de graduação. Em muitos casos, perante a violência e o crime, o ECA é mais rigoroso do que o Código Penal. Portanto a afirmação de autoridades estaduais de que a legislação seria um estímulo à delinqüência não procede.

Exemplo desse rigor do ECA temos no caso do índio Galdino, quando cinco jovens da alta classe média em Brasília causaram sua morte, ateando fogo às suas vestes. Quatro eram maiores, um era menor. Destes, apenas o adolescente foi detido de imediato, enquanto se investigava o crime. No final das apurações, foi o único dentre os cinco que aguardou o julgamento em regime de internação, enquanto os demais permaneceram em liberdade.

Outro dado a considerar é o rito sumário. O ECA permite que a denúncia, investigação e julgamento tramitem em até 45 dias, sem que o adolescente tenha direito aos recursos, protelações ou apelações previstos no Código Penal para os adultos.

2. O problema com os jovens autores de atos infracionais não é extensivo, não é crônico, não é nacional e de maneira alguma decorrente das garantias previstas no ECA.

Uma das piores condições para os adolescentes autores de atos infracionais se encontra no Estado de São Paulo, onde a Febem-SP já deveria ter sido desmontada há muito tempo, promessa feita diversas vezes e não cumprida. Em outros Estados, a exemplo do Rio Grande do Sul, avançou-se na implementação do ECA com a internação de adolescentes em pequenas unidades, além da elaboração e execução de projetos e programas viabilizando o exercício de sua cidadania.

Modificar o ECA é uma sugestão descabida

Modificar o ECA, quando ele finalmente começa a ser implementado em todo o país e assumido pela sociedade, é um retrocesso. O fato de os internos cometerem infração quando estão sob a tutela do Estado é um absurdo. É o Estado que deve mudar e não o ECA.

Com relação às medidas propostas e/ou executadas pelo Governo do Estado, consideramos que:

1. A transferência de 244 adolescentes da Febem, realizada no dia 16/4/03 para presídios é uma ilegalidade. Mais uma vez, o Governo do Estado descumpriu a lei.

2. A "cadeia" para adolescentes é contraditória com a nova proposta socioeducacional da Febem anunciada pelas autoridades estaduais.

3. As propostas que estão sendo colocadas em pauta aparecem sempre que ocorrem rebeliões na Febem, e são, em sua maioria medidas açodadas e imediatistas, incompatíveis com a gravidade e complexidade dos problemas que têm que ser enfrentados.

Contrários a qualquer alteração no Estatuto da Criança e do Adolescente, e à tentativa de substituir o fracasso na aplicação da lei pela alteração na lei, como propõe o Governo do Estado de São Paulo, consideramos que, para melhor atendimento aos adolescentes autores de ato infracional, é necessário que o Estado e o Poder Judiciário nas suas esferas de competência:

1. Fortaleçam os Conselhos de Direitos,

* dando-lhes condições de funcionamento;

* contribuindo para garantir sua representatividade e paridade;

* respeitando sua legitimidade;

*garantindo que suas resoluções sejam acatadas pelos operadores do sistema e que sejam assumidas, na prática, como força de lei.

2. Assegurem que os casos de tortura, violência, maus tratos e abusos de autoridade perpetrados por policiais e funcionários das unidades sejam investigados e punidos exemplarmente;

3. Providenciem a adequação dos alojamentos para receber os adolescentes que aguardam a apresentação ao Ministério Público, no período de 24 horas;

4. Promovam profunda discussão e reequacionamento da participação dos policiais militares nas unidades de internação;

5. Implantem centros integrados de atenção ao adolescente em conflito com a lei, onde atuem articuladamente o Poder Judiciário, o Ministério
Público, a Defensoria;

6. Ampliem a capacidade operacional das Promotorias de Justiça da infância e juventude;

7. Garantam que o Estado de São Paulo tenha sua defensoria pública e que o defensor público seja capacitado para atuar nas questões específicas sobre a infância e adolescência;

8. Ampliem e descentralizem as Varas Especializadas da Infância e da Adolescência e que haja melhor capacitação dos juízes para atuar na aplicação das medidas socioeducativas, conforme o espírito do ECA;

9. Extingam a Febem-SP, por falência do atual modelo, e criem um novo órgão com estrutura de atendimento e projeto socioeducativo para estes
adolescentes, adequado ao que estabelece  o Estatuto da Criança e do Adolescente há 13 anos.

Cremos na capacidade de reinserção dos adolescentes que cumprem as medidas socioeducativas determinadas pelo ECA. Este é o compromisso do Estado, não só perante o Estatuto, mas perante a Constituição Federal e a Convenção sobre os Direitos da Criança aprovada pela ONU.

Cumprindo a lei construímos, no presente, o país que desejamos.


Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente
Unicef
Associação de Mães e Amigos da Criança e do Adolescente em Risco - Amar
Associação Olha o Menino
Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil/SP
Comissão Theotônio Vilela de Direitos Humanos
Condepe
Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de São Paulo
Faculdade de Psicologia PUC SP
Fórum Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de São Paulo
Fórum Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de São Paulo
Grupo Tortura Nunca Mais
Ilanud -Instituto Latino Americano das Nações Unidas para a Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente
Instituto Sou da Paz
Justiça Global
Projeto Meninos e Meninas de Rua de São Bernardo do Campo                                 
Conselho Regional de Serviço Social -Iades
Confederação Nacional dos Trabalhadores do setor mineral
Comissão para Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção do Trabalhador
Adolescente na região citrícola do estado de São Paulo
Afubesp -Associação dos Funcionários do Banespa
Fórum Paulista de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil
Frente Nacional dos Trabalhadores
Centro de Convivência Jardim Vista Alegre
Pacto São Paulo
Coletivo de Crianças, Adolescentes e Jovens do Estado de São Paulo


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