22/07/2013 Undime
Brasília, 22 de julho de 2013
Carta à Sociedade
O Dirigente Municipal de Educação e a gestão do direito à educação e ao conhecimento
Comentários críticos ao texto da Secretaria do Tesouro Nacional
No último mês de maio, a Undime promoveu seu 14º Fórum Nacional com a participação de mais de mil Secretários Municipais de Educação de todos os estados brasileiros. Na pauta, políticas públicas, inclusão social e educacional, gestão, planejamento, financiamento da educação. O título dado a essa Carta ?O Dirigente Municipal de Educação e a gestão do direito à educação e ao conhecimento? foi o tema desenvolvido pelo prof. Miguel Arroyo na penúltima conferência do Fórum. A palestra seguinte apresentou diversos aspectos sobre o financiamento da educação. Encerramos, assim, nosso encontro nacional a partir do princípio norteador da Undime: a defesa do direito à educação com qualidade social. E debatendo sobre como aumentar os recursos para a educação básica pública.
Ao longo de sua história, a Undime acumula notas públicas, estudos, pesquisas, publicações sobre gestão municipal, realizadas individualmente ou em parceria com instituições, organismos internacionais ou governamentais como o Fundo das Nações Unidas para a Infância no Brasil (Unicef), Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Ministério da Educação, Fundação Itaú Social, Campanha Nacional pelo Direito à Educação, entre outras parcerias. E, em nosso trabalho diário, lutamos para desmitificar alguns sensos comuns, quais sejam: a origem dos ?problemas? da educação pública não é de ordem financeira, mas sim de gestão; os Dirigentes Municipais de Educação não possuem formação adequada; a educação pública não possui qualidade alguma; para citar os principais.
Nós, gestores educacionais, podemos afirmar que um dos principais problemas da educação é ter de ouvir os chamados especialistas como formadores de opinião, principalmente aqueles que se consideram ?especialistas em educação? sem nunca terem ?pisado? em uma escola pública.
Na atual conjuntura política, quando a sociedade está envolvida no debate do Plano Nacional de Educação, que tramita no Congresso Nacional desde dezembro de 2010, que recebeu mais de 3000 emendas e em que defendemos o investimento de 10% do PIB em educação pública e a implementação do CAQi (Custo Aluno Qualidade Inicial); quando estão sendo realizadas conferências municipais e intermunicipais de educação preparatórias às Conferências Estaduais de Educação e à Conae 2014 (a ser realizada em fevereiro do próximo ano); quando está sendo votado o Substitutivo do Projeto de Lei 323/ 2007 que destinará os recursos do petróleo (royalties e Fundo Social do Pré-Sal) à educação pública; analistas de finanças e controle da Secretaria do Tesouro Nacional e uma professora da USP publicam o seguinte texto ?É possível atingir as metas para a educação sem aumentar os gastos? Uma análise para os municípios brasileiros? (TD nº 15/ 2013) e concluem que, sim, é possível. Todo esse contexto é no mínimo surpreendente.
Infelizmente, os autores do texto não entraram em contato com a Undime, nem devem ter lido algumas de nossas publicações. Se tivessem o feito, teriam sido informados que:
- o Ideb não foi criado para apontar a necessidade ou não de investimentos financeiros. O uso desse indicador já é suficientemente desvirtuado pelo emprego da meritocracia, dos simulados, das fraudes durante a aplicação das provas, para ter que se inventar um novo uso desse índice;
- os resultados do Ideb 2009 para os municípios foram melhores que os do Ideb 2011 (aqui estamos fazendo uma suposição de que o estudo utilizou o Ideb 2009, pois a única citação que há é o do Censo Escolar 2010);
- os municípios precisam atender a uma grande demanda (ainda não estimada) de alunos para creche. Dessa forma, são necessários mais recursos financeiros para se construir escolas, organizar infraestrutura adequada, contratar profissionais da educação;
- a Lei 11.738/ 2008 (Piso Salarial Profissional Nacional para os Profissionais do Magistério Público da Educação Básica) ainda não foi implementada na grande maioria dos municípios;
- os municípios investem muitos recursos em alfabetização e educação de jovens e adultos;
- os dados fornecidos pelo Siope (Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação) apresentam fragilidades ao se analisar os percentuais de investimento por etapa e modalidade (vide pesquisa Perfil dos Gastos Educacionais nos Municípios Brasileiros ? Undime/ Unicef/ Fundação Itaú Social);
- 3,7 milhões de crianças e adolescentes de 4 a 17 anos estão fora da escola no Brasil (vide pesquisa Unicef/ Campanha Nacional pelo Direito à Educação);
- 8,8 milhões de alunos das séries iniciais e finais do ensino fundamental encontram-se em risco de exclusão escolar (vide pesquisa Unicef/ Campanha Nacional pelo Direito à Educação);
- há inúmeras demandas da diversidade econômica e social brasileira para serem atendidas, as quais ?fórmulas mágicas? não conseguirão resolver;
- as metas que devem nortear a educação brasileira são as que estão em discussão no Plano Nacional de Educação (PNE), que vão além das do Ideb.
Mas, principalmente, se os autores do texto tivessem conversado com a Undime nunca teriam começado seu trabalho com o seguinte parágrafo: ?O redesenho do sistema federativo realizado após a redemocratização do país teve como grandes beneficiários os municípios, que ao mesmo tempo em que passaram a ser responsabilizados por mais gastos puderam contar com mais recursos?. A própria Secretaria do Tesouro Nacional informa que, em 2010, na divisão do bolo tributário a União ficava com 57,6% dos tributos, os estados com 24,7% e os municípios com 18,3%. Em contrapartida, segundo o Inep, na participação do gasto público global em educação, no ano de 2009, a União representava apenas 20%, os Estados 41% e os municípios 39%.
Apesar das reiteradas tentativas fracassadas de se mostrar que não há necessidade de aumentar o investimento na educação básica pública, a Undime continua defendendo padrões mínimos de qualidade, por meio do CAQi e do CAQ; Piso e Carreira para os profissionais do magistério; aprovação do PNE com 10% do PIB para a educação pública para que todas as metas e estratégias propostas sejam cumpridas; implementação dos Planos Municipais de Educação em consonância com o PNE; implementação do Sistema Nacional de Educação e do Regime de Colaboração. Continua trabalhando para melhorar a gestão - porque sempre há o que melhorar - e ampliar os recursos para a educação. Esperamos que não surjam mais adeptos a essa disputa vazia e errônea entre melhoria da gestão pública versus ampliação do financiamento, principalmente opinando de forma aligeirada.
A Undime continua lutando para que o Estado cumpra seu dever de atender o direito à educação de toda criança, adolescente, jovem e idoso, com qualidade social, direito esse que o texto em questão passou ao largo.
Cleuza Rodrigues RepulhoDirigente Municipal de Educação de São Bernardo do Campo/ SP Presidenta da Undime
Clique aqui para acessar a Carta na versão pdf.
Leia mais:
Estudo do Tesouro Nacional - É possível atingir as metas para a educação sem aumentar os gastos? Uma análise para os municípios brasileiros
Matérias publicadas no Jornal O Globo
Estudo de analistas do Tesouro diz que ineficiência compromete 40% das verbas para o ensino
MEC e especialistas criticam pesquisa de analistas do TesouroReportagem da Rádio CBNPrefeituras desperdiçam mais de 40% dos recursos usados em educaçãoReportagem do Jornal da CulturaEstudo publicado por funcionários da secretária do Tesouro Nacional aponta que o problema da educação no Brasil não é falta de recursosBrasília, 22 de julho de 2013 Carta à Sociedade O Dirigente Municipal de Educação e a gestão do direito à educação e ao conhecimento Comentários críticos ao texto da Secretaria do Tesouro Nacional No último mês de maio, a Undime promoveu seu 14º Fórum Nacional com a participação de mais de mil Secretários Municipais de Educação de todos os estados brasileiros. Na pauta, políticas públicas, inclusão social e educacional, gestão, planejamento, financiamento da educação. O título dado a essa Carta ?O Dirigente Municipal de Educação e a gestão do direito à educação e ao conhecimento? foi o tema desenvolvido pelo prof. Miguel Arroyo na penúltima conferência do Fórum. A palestra seguinte apresentou diversos aspectos sobre o financiamento da educação. Encerramos, assim, nosso encontro nacional a partir do princípio norteador da Undime: a defesa do direito à educação com qualidade social. E debatendo sobre como aumentar os recursos para a educação básica pública. Ao longo de sua história, a Undime acumula notas públicas, estudos, pesquisas, publicações sobre gestão municipal, realizadas individualmente ou em parceria com instituições, organismos internacionais ou governamentais como o Fundo das Nações Unidas para a Infância no Brasil (Unicef), Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Ministério da Educação, Fundação Itaú Social, Campanha Nacional pelo Direito à Educação, entre outras parcerias. E, em nosso trabalho diário, lutamos para desmitificar alguns sensos comuns, quais sejam: a origem dos ?problemas? da educação pública não é de ordem financeira, mas sim de gestão; os Dirigentes Municipais de Educação não possuem formação adequada; a educação pública não possui qualidade alguma; para citar os principais. Nós, gestores educacionais, podemos afirmar que um dos principais problemas da educação é ter de ouvir os chamados especialistas como formadores de opinião, principalmente aqueles que se consideram ?especialistas em educação? sem nunca terem ?pisado? em uma escola pública. Na atual conjuntura política, quando a sociedade está envolvida no debate do Plano Nacional de Educação, que tramita no Congresso Nacional desde dezembro de 2010, que recebeu mais de 3000 emendas e em que defendemos o investimento de 10% do PIB em educação pública e a implementação do CAQi (Custo Aluno Qualidade Inicial); quando estão sendo realizadas conferências municipais e intermunicipais de educação preparatórias às Conferências Estaduais de Educação e à Conae 2014 (a ser realizada em fevereiro do próximo ano); quando está sendo votado o Substitutivo do Projeto de Lei 323/ 2007 que destinará os recursos do petróleo (royalties e Fundo Social do Pré-Sal) à educação pública; analistas de finanças e controle da Secretaria do Tesouro Nacional e uma professora da USP publicam o seguinte texto ?É possível atingir as metas para a educação sem aumentar os gastos? Uma análise para os municípios brasileiros? (TD nº 15/ 2013) e concluem que, sim, é possível. Todo esse contexto é no mínimo surpreendente. Infelizmente, os autores do texto não entraram em contato com a Undime, nem devem ter lido algumas de nossas publicações. Se tivessem o feito, teriam sido informados que: - o Ideb não foi criado para apontar a necessidade ou não de investimentos financeiros. O uso desse indicador já é suficientemente desvirtuado pelo emprego da meritocracia, dos simulados, das fraudes durante a aplicação das provas, para ter que se inventar um novo uso desse índice; - os resultados do Ideb 2009 para os municípios foram melhores que os do Ideb 2011 (aqui estamos fazendo uma suposição de que o estudo utilizou o Ideb 2009, pois a única citação que há é o do Censo Escolar 2010); - os municípios precisam atender a uma grande demanda (ainda não estimada) de alunos para creche. Dessa forma, são necessários mais recursos financeiros para se construir escolas, organizar infraestrutura adequada, contratar profissionais da educação; - a Lei 11.738/ 2008 (Piso Salarial Profissional Nacional para os Profissionais do Magistério Público da Educação Básica) ainda não foi implementada na grande maioria dos municípios; - os municípios investem muitos recursos em alfabetização e educação de jovens e adultos; - os dados fornecidos pelo Siope (Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação) apresentam fragilidades ao se analisar os percentuais de investimento por etapa e modalidade (vide pesquisa Perfil dos Gastos Educacionais nos Municípios Brasileiros ? Undime/ Unicef/ Fundação Itaú Social); - 3,7 milhões de crianças e adolescentes de 4 a 17 anos estão fora da escola no Brasil (vide pesquisa Unicef/ Campanha Nacional pelo Direito à Educação); - 8,8 milhões de alunos das séries iniciais e finais do ensino fundamental encontram-se em risco de exclusão escolar (vide pesquisa Unicef/ Campanha Nacional pelo Direito à Educação); - há inúmeras demandas da diversidade econômica e social brasileira para serem atendidas, as quais ?fórmulas mágicas? não conseguirão resolver; - as metas que devem nortear a educação brasileira são as que estão em discussão no Plano Nacional de Educação (PNE), que vão além das do Ideb. Mas, principalmente, se os autores do texto tivessem conversado com a Undime nunca teriam começado seu trabalho com o seguinte parágrafo: ?O redesenho do sistema federativo realizado após a redemocratização do país teve como grandes beneficiários os municípios, que ao mesmo tempo em que passaram a ser responsabilizados por mais gastos puderam contar com mais recursos?. A própria Secretaria do Tesouro Nacional informa que, em 2010, na divisão do bolo tributário a União ficava com 57,6% dos tributos, os estados com 24,7% e os municípios com 18,3%. Em contrapartida, segundo o Inep, na participação do gasto público global em educação, no ano de 2009, a União representava apenas 20%, os Estados 41% e os municípios 39%. Apesar das reiteradas tentativas fracassadas de se mostrar que não há necessidade de aumentar o investimento na educação básica pública, a Undime continua defendendo padrões mínimos de qualidade, por meio do CAQi e do CAQ; Piso e Carreira para os profissionais do magistério; aprovação do PNE com 10% do PIB para a educação pública para que todas as metas e estratégias propostas sejam cumpridas; implementação dos Planos Municipais de Educação em consonância com o PNE; implementação do Sistema Nacional de Educação e do Regime de Colaboração. Continua trabalhando para melhorar a gestão - porque sempre há o que melhorar - e ampliar os recursos para a educação. Esperamos que não surjam mais adeptos a essa disputa vazia e errônea entre melhoria da gestão pública versus ampliação do financiamento, principalmente opinando de forma aligeirada. A Undime continua lutando para que o Estado cumpra seu dever de atender o direito à educação de toda criança, adolescente, jovem e idoso, com qualidade social, direito esse que o texto em questão passou ao largo. Cleuza Rodrigues Repulho Dirigente Municipal de Educação de São Bernardo do Campo/ SP Presidenta da Undime Clique aqui para acessar a Carta na versão pdf. Leia mais: Estudo do Tesouro Nacional - É possível atingir as metas para a educação sem aumentar os gastos? Uma análise para os municípios brasileiros Matérias publicadas no Jornal O Globo Estudo de analistas do Tesouro diz que ineficiência compromete 40% das verbas para o ensino MEC e especialistas criticam pesquisa de analistas do Tesouro Reportagem da Rádio CBN Prefeituras desperdiçam mais de 40% dos recursos usados em educação Reportagem do Jornal da Cultura Estudo publicado por funcionários da secretária do Tesouro Nacional aponta que o problema da educação no Brasil não é falta de recursos